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30 de ago. de 2021

Acordo tácito

   Todos os dias, Caetano fazia o mesmo percurso: saía a pé de sua casa, com a carteira no bolso dianteiro da calça, ia até a padaria que ficava a poucos metros dali, comprava pãozinho da primeira fornada para chegar em casa e comê-lo quentinho. Contemplava durante alguns minutos a colherada de manteiga derretendo enquanto passava uma xícara de café preto, sem açúcar, que sorvia devagarinho. Lavava a pouca louça, pendurava com cuidado e meticulosamente o pano de prato  para secar no varalzinho que tinha dentro da lavação, fechava a casa toda, se arrumava para o trabalho, conferia novamente se todas as janelas estavam fechadas, pegava a bicicleta e saía assoviando. Tão pontual era essa sua rotina que a vizinhança já sabia que horas eram quando o viam saindo para trabalhar. Também não consultavam seus relógios quando o viam voltando, assoviando melodias variadas, abrindo o portão da frente e em seguida pegando seu regador para aguar as flores do pequeno jardim que mantinha, empreitada que em menos de cinco minutos já estava completa. Em seguida, antes que o escuro da noite tornasse as formas do quinta indistinguíveis, ele fazia uma limpeza na pequena horta que mantinha, tirando ervas daninhas que insistiam em aparecer diariamente. Depois, não mais era visto, até o dia seguinte quando novamente ia comprar o pão quentinho. 

      Ninguém sabia exatamente onde e no que trabalhava, se tinha família ou qual sua idade. O conheciam de vê-lo na rua, quando ia fazer compras ou indo e voltando do trabalho. Cumprimentava e era cumprimentado de volta, participava de conversas corriqueiras (“nossa, que tempo maluco tem feito nesses últimos dias”) e não passava muito disso. Ninguém se sentia seguro o suficiente para ultrapassar essa fronteira de cordialidade entre vizinhos. Também não sabiam exatamente há quanto tempo Caetano morava ali naquela casa, se já havia mais gente ali ou se sempre morava sozinho. A despeito do que tradicionalmente acontecia naquela vizinhança, não costumava visitar outras pessoas, nem convidá-las a visitar sua casa, ou seja, o que conheciam era apenas o que Caetano permitia vislumbrar. E estava tudo bem assim. Ninguém parecia ter problemas com isso, aliás, deveria ter? 

    Até o dia em que um pacote com cinco pãezinhos não saiu da padaria. Não se sentiu cheiro de café. A rua ficou mais silenciosa, sem os costumeiros assobios. Não se viu a bicicleta sair, nem voltar. As flores ficaram esperando no canteiro, pela água que não chegou. As ervas daninhas começaram a aparecer entre as alfaces e pés de tomate. A princípio, os vizinhos pensaram que estivesse doente. A senhora que morava ao  lado notou a casa totalmente fechada. Alguém pensou em ligar, porém notou que não sabia o número de Caetano. Na verdade, ninguém por aí sabia se ele tinha telefone. 

   Várias vezes bateram, chamaram, gritaram, inutilmente. Resolveram então chamar a polícia. A porta foi arrombada e a surpresa tomou conta de todos. Tudo na casa estava impecavelmente arrumado, em perfeita ordem...porém o cheiro típico de casa fechada e uma camada de poeira não tão fina sobre todos os móveis e piso parecia mostrar que seu dono a abandonara há mais que apenas dois dias. 

Não havia registro de nenhuma pessoa chamada Caetano na delegacia, ao menos não com as características físicas que o desaparecido apresentava. Nenhum número de contato pendurado na porta da geladeira, nenhuma anotação no calendário que estava na cozinha, nenhuma agenda com telefones. Onde ele trabalhava poderia haver alguma informação, uma das vizinhas comentou, para logo em seguida lembrar que ninguém na vizinhança sabia onde era esse trabalho - e se realmente existia um emprego.

   No pequeno quintal, o regador repousava, seco, perto do canteiro de flores que começavam a sofrer os efeitos do sol inclemente enquanto uma fileira de formigas se dirigia para a horta. O pequeno grupo de vizinhos, silenciosamente, deu de ombros e cada qual dirigiu-se para sua casa, ruminando esse mistério. 

   Ninguém apareceu para reclamar o terreno, procurar por Caetano ou perguntar por ele aos vizinhos. Semanas se passaram com todos tentando fingir que nada de extraordinário acontecera. Mas não foi possível evitar  que teorias, das mais simples às mais mirabolantes, fossem compartilhadas e se espalhassem por todo o pequeno bairro e em breve na cidade toda. 

   Um belo dia, meses depois, a casa amanheceu com as janelas abertas, reacendendo rumores e a curiosidade da quase novamente pacata vizinhança. Conforme o dia passava, o terreno foi sendo limpo e ganhando os contornos de outrora, a água e a energia foram religadas. Canteiros de flor foram reaparecendo, exatamente no mesmo lugar. Um dos vizinhos aproximou-se e ouviu um assobio. Será possível? Teria Caetano simplesmente voltado e retomado sua vida de onde parou? Por uma das janelas, o vulto de uma mulher apareceu. Antes que o vizinho pudesse sair do terreno, a mulher subitamente virou-se e abriu um sorriso: 

- Boa tarde! 

Hesitante, o homem respondeu ao cumprimento e não conseguiu evitar a pergunta que aflorou espontaneamente:

 - A senhora conheceu o sr. Caetano? 

- Quem? 

- Morou aqui antes da senhora. Achei que fosse parente. 

- Nunca ouvi falar. Soube desta casa pelo site de uma corretora e aqui estou. 

- E não foi o Caetano que colocou para alugar?

- Não aluguei, comprei. Não sei quem era o dono. 

- Certo... preciso sair, outra hora conversamos. 

 E os dias começaram a seguir como se a casa nunca houvesse ficado vazia. Irene, este era o nome dela, levantava cedo, saía a pé para pegar cinco pãezinhos frescos, os punha em uma sacola de pano que levava ao ombro, saboreava devagarinho um dos pães com uma pequena colher de manteiga enquanto bebia uma xícara de café preto, sem açúcar. Fechava a casa toda, dava de comer ao gato, saia assoviando com sua bicicleta e voltava quase ao final da tarde, a tempo de regar o pequeno jardim e cuidar da horta, ambos nos mesmos locais e com as mesmas proporções que o morador anterior mantinha. Sentava-se à varanda com o gato no colo e ficava lá até que a escuridão tomasse conta da rua, ou até os pernilongos não a deixarem mais contemplar as estrelas. Depois só era vista novamente na manhã seguinte, quando  ia comprar seus pãezinhos, com sua sacola ao ombro. 

    Ninguém sabia da vida de Irene mais do que ela permitia-se mostrar. E todos ali por perto preferiram continuar sem saber. 

27 de ago. de 2021

1 Imagem, 140 Caracteres #410

 Bom dia, sexta-feira! 

Bom dia, povo! 

 

Espero que estejam bem! (e espero também um pouco de chuva). Não sei como está agora, é noite e programei esta postagem,então enquanto vocês leem, eu posso estar dormindo, ou indo para o trabalho, enfim, depende que hora estas linhas estiverem chegando a seus olhos. Chega dessa enrolação toda, ahhaha. 

No dia 22 comemoramos o dia do folclore brasileiro. Muita gente pensa que essa palavra se refere apenas às lendas ( e lembra sempre das mesmas), mas não é! A definição de folclore abrange as manifestações culturais: mitos, lendas, músicas, costumes, alimentação, parlendas, adivinhações, histórias como por exemplo os contos de acumulação, festas regionais, expressões idiomáticas, ufa! Como professora, acho importante valorizarmos a cultura de todas as regiões brasileiras e parar com o que Glauber Rocha já chamava de síndrome do vira-lata! Temos uma cultura muito rica e que precisa ser mais valorizada!

 

Mas enfim, vamos à imagem desta semana? 

 

Foto extraída do site Toda Matéria

 Descrição: a imagem mostra pessoas na manifestação folclórica do Bumba-Meu-Boi, que muitos chamam também de Boi Bumbá. Um senhor, vestido com calça e jaqueta nas cores vermelha e branca e utilizando um chapéu com fitas coloridas está de frente para o "boi", feito com tecido preto ornamentado com desenhos de flores coloridas e padrões geométricos até a linha onde ficariam as pernas, que está ornamentada com fitas coloridas e outro tecido de cor dourada que chega até o chão. Os chifres do "boi" são dourados com fitas coloridas nas pontas. É possível ver um dos tênis de uma das pessoas que está dando vida ao boi. Muitas pessoas estão assistindo a apresentação. 

 

 

Bumba, meu boi, 

Dança, boi bumbá

Enche o coração de festa 

Até o dia raiar!  

 

Até a próxima! 

 

 

22 de ago. de 2021

Um passo para frente, dois para trás... Mas sem parar de caminhar

   Falam que a TV influencia muito as pessoas. 

   Aí fiquei pensando: Minha geração cresceu vendo Star Trek (falava sobre tolerância e diversidade), X-Men ( falava sobre preconceito com o diferente), Família Dinossauro (trouxe tantas questões sociais à tona: machismo, misoginia, preconceito, discurso vazio das elites, ecologia...); cresceu também vendo He-Man e She-Ra (que sempre tinham alguma lição de moral no final dos episódios),Star Wars (mostra muito sobre política usada para o mal e sobre fascismo, por exemplo)

    Então, se a influência das horas passadas em frente à TV sobre o caráter das crianças é tão grande, porque tanta gente da nossa geração, que assistia estes seriados, filmes e desenhos, agora depois de adultas pregam o contrário disto? 

  Por que tanta gente idolatra falsos profetas, endeusa políticos, pratica o mal jurando de pé junto que é bom cidadão? 

  Por que as pessoas ainda não entendem ou fingem não entender que suas atitudes estão prejudicando tanto nosso mundo, e que não temos para onde fugir quando nossos recursos se esgotarem de vez? 

  Por que tanta gente estufa o peito para dizer que é honesto, que defende valores morais, mas vive repetindo ideias e valores nada éticos, destilando preconceito e ainda acusando e agredindo quem realmente defende a honestidade, a caridade e o bom senso? 

Lemos tanto, ouvimos tanto, aprendemos tanto, avançamos tanto em tecnologia, medicina e ciência no geral e ainda temos de lidar com o risco de acabar em uma sociedade que mistura 1984, Admirável Mundo Novo e o Conto da Aia. Olha, tem dias em que sinceramente a gente desanima.

  Temos uma geração que não entendeu nada do que assistiu, do que leu, do que aprendeu na escola. Onde foi que nos perdemos?

    A Bíblia diz, em um dos livros do Novo Testamento, que " o amor de muitos esfriará". De muitos, não de todos. Por isso, ainda precisamos acreditar e não esmorecer. Parece difícil, e é. 

Fico com Renato Russo, quando diz "a humanidade é desumana, mas ainda temos chance" 

 


 

20 de ago. de 2021

1 Imagem 140 Caracteres #409

 Bom dia, sexta-feira! 

Como vocês estão? 


Aqui uma hora a coisa vai, outra hora a gente tem de empurrar, mas sempre em frente! 

Enquanto escrevo isso o dia está amanhecendo e os passarinhos saúdam o novo dia, está delicioso de ouvir.  

Uma coisa fascinante é a capacidade que nós temos de, através da Arte, reinterpretar e ressaltar a beleza do mundo, da natureza que nos preza. Um viva aos artistas! 

Pensando nisso, escolhi a seguinte imagem:

 

Imagem obtida no site Amo Pintar

 

Descrição: a imagem mostra uma paleta de pintura. Há cores quentes e frias: amarela, laranja, vermelha, branca, azul em vários tons, preto, com as marcas de pincéis mostrando que a paleta está ou esteve sendo utilizada. Há cinco pincéis com espessuras diferentes apoiados no lugar onde o pintor apoiará seu dedo, com parte dos cabos deixando a paleta levemente levantada.



Misturo, crio, as cores me alegram. 

O mundo inteiro é minha inspiração!

 

 Bom final de semana!

 

 

 

 

13 de ago. de 2021

1 Imagem, 140 Caracteres # 408

 Boa noite de sexta! 

Falta de inspiração (é, acontece) e tempo meio corrido me fizeram sentar agora, nesta hora para finalmente poder escrever! 

 Em primeiro lugar, quero agradecer a todas as pessoas que, tanto aqui no blog quanto nas redes sociais, passaram para deixar felicitações pelo aniversário que foi esta semana. No meio de tanta loucura que tem sido estes últimos tempo, foi um dia feliz em que me permiti sentir o carinho de tantas pessoas ao meu redor, presencial ou virtualmente. 

Obrigada, povo! 

 

Agora, a imagem desta semana, nesta sexta-feira treze que muitas pessoas ainda temem em pleno 2021! 

 

Imagem obtida no site SRDZ

Descrição: a imagem mostra, do nariz para cima, a face de um gato negro, com olhos amarelos e arregalados e orelhas em pé, em posição de alerta, aparecendo por trás de um pedaço de madeira, possivelmente de um banco ou parapeito. 

(Gente, eu nunca expliquei direito, a descrição que faço das imagens é uma tentativa de deixar o blog um pouco mais acessível aos deficientes visuais. Inclusive gostaria que alguém que faz uso destas descrições comentasse no que devo melhorar. Abraços!)


Ei! Você aí! Por que tem medo de mim? O que tem a cor do meu pelo a ver com hoje? Humano, você é estranho!
 
 
Bom final de semana e até mais! 
 
 

6 de ago. de 2021

1 Imagem, 140 Caracteres #407

 Olá! 

Espero que a sexta-feira tenha começado bem para vocês! 


Mais uma semana se passou, e aqui estamos para mais uma edição da nossa tradicional blogagem coletiva! 

Vamos ver qual a imagem desta semana?


Imagem de minha autoria

Descrição:  a imagem mostra um pequeno pé de abacate, fotografado de cima. A imagem quase toda está embaçada, podendo-se ver em primeiro plano uma folha com uma gotícula de água prestes a cair em sua ponta, denotando que acabou de chover. 


A chuva na dose certa traz vida, alegria, promessas e expectativas. 

 

Tenham um bom final de semana! 

 

 

 

1 Imagem, 140 Caracteres #541

 Bom dia para todo mundo!  Não consegui postar antes, pois estava com problemas no computador e não gosto de blogar (ainda posso escrever es...