A guitarra já estava afinada. A bateria, colocadinha lá no palco. O
baixo, nas mãos de seu dono. Casa cheia, seria uma noite ótima! Clarissa já
ouvia em sua mente os acordes do baixo. Tum, tum, tum... dedilhava no ar uma de
suas músicas favoritas. O grupo tocaria hoje covers do Kiss e, se desse tempo, Iron Maiden . Baixo. Um dos sons que as pessoas menos prestavam atenção.
Discreto como Clarissa. Muita gente esperava os shows de rock para ver os
trejeitos e solos de guitarra ou delirar com o baterista colocando sua força
nos pratos e tambores, mas Clarissa sabia.
A música é isso, tem de ter a
harmonia. Rock não é só bateria e guitarra. Sem o baixo, muitas músicas não
teriam a graça que tem. “Se você está aqui, dos Titãs”, por exemplo. Caramba,
teria muita diferença se não fosse o som do baixo na música o tempo todo,
preenchendo com seu tom grave o refrão e o tempo sem voz. Nem todos prestam
atenção, mas faria falta sim. Da mesma forma que ela e a equipe de trabalho.
Todos viam os músicos no palco, mas poucos paravam para pensar no
trabalho de toda uma equipe, mais numerosa que os componentes da banda, que
passariam facilmente despercebidos na rua. Toda uma equipe trabalhando para um
resultado final.
A banda logo se apresentaria. Clarissa verificou novamente se todos os
itens essenciais no palco estavam em seus lugares. O guitarrista dava uma
última verificada em seu instrumento. As luzes estavam sincronizadas, já haviam sido
testadas. Desde as duas da tarde, quando começou a passagem de som, Clarissa
estava lá. Chegou até a dedilhar no baixo alguns acordes de Babilônia Blues.
Faltavam menos de cinco minutos para o show começar. Todos já estavam a postos.
Clarissa fez um silencioso sinal de positivo com o polegar, e todos foram ao
palco.
Continuava ali, assistindo dos bastidores. Ganhara o baixo do seu pai, e
ainda o conservava bem. Tocava eventualmente com alguns amigos, mas ainda não
cruzara a fronteira que a separava do palco. Há alguns anos conseguira este
emprego, nos bastidores. Sempre eficiente e meticulosa, era a funcionária
favorita da banda, porém por alguma razão que talvez fosse maior que simples
timidez, não manifestava sua vontade crescente de estar no palco com os músicos, em vez de apenas contemplá-los tocando após todo o trabalho. Fazia parte
da banda, de alguma forma. Se não estivesse ali para checar o som, luzes,
passar a playlist e providenciar
outros artigos de necessidade, os shows não aconteceriam com o mesmo brilho. Ou
talvez nem acontecessem.
Enquanto a música contagiava o ambiente e a galera ia ao delírio com “I
wanna Rock and Roll All Night”, Clarissa discretamente buscou o baixo que
estivera dentro do carro e, aproveitando um canto nos bastidores em que poderia
ver seus amigos na banda sem deixar-se notar, foi dedilhando notas que somente
ela ouviria. Não deixaria de praticar. Quem sabe um dia.
Que legal a história da Clarice que, quem sabe, poderia ter sido sucesso na banda!!! beijos, tudo de bom,chica
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