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9 de fev. de 2012

Carta encontrada em cima do travesseiro.

                     "As cicatrizes da alma... Essas não saram". 
                                       (Athange Ferreira, em entrevista ao blog  Escritos Lisérgicos)


Sim.
Você conseguiu...
Agora, olhando-me ao espelho, tenho certeza. Você conseguiu.
Conseguiu despertar o pior de mim, tirar minha felicidade... roubar minha alegria de viver, aos pouquinhos,tirando um pedaço de mim cada vez que discutíamos.
Deus, como eu tentei ajudar você! Cada vez que você caía na fossa, cada vez que você ficava deprimido.


Quanto tempo gastei me recriminando, pensando que não sabia desempenhar o papel de esposa, pedindo desculpas mesmo quando eu sabia que estava certa!
O tempo foi passando e meu sorriso foi sumindo... fui ficando doente, acordei passando mal tantas vezes, mas não tive o que precisava: sua compreensão.
Nosso relacionamento há tempos não é mais uma via de mão dupla.
Por que sempre eu tenho de ser a compreensiva, por que sempre eu tenho de ceder, sempre eu tenho de pedir desculpas, ser a primeira a ir a teu encontro?
Nunca pedi nada de absurdo, um pouco só de reciprocidade, é tão difícil assim?
Depois de tantos anos que passamos juntos, de tantos gestos de carinho e ternura que você sempre fazia questão de demonstrar, fazendo-me sentir a melhor mulher do mundo?

Onde você se perdeu?  Onde foi parar o homem que me ensinou a amar?

Desisti da ideia de que eu que não estava sendo compreensiva, amorosa, esposa o suficiente. Estou me sentindo sugada, me anulei estupidamente para ver você feliz, e nada que eu faço ou fale adianta.
Só você pode sair desse mundo negro de desânimo, de raiva, de ansiedade.
Só você pode se ajudar.

Porém, mesmo sabendo que a culpa não é minha, não consigo voltar atrás.
Pois tudo o que eu era, morreu. Inclusive meus sonhos.
Sabe, eu estou doente.
Tantos anos ouvindo recriminações, tendo de me defender de seus ataques de nervos, que por pouco não beiraram à violência física, abalaram-me muito.

Não consigo voltar a ser o que eu era.

Eu era seu arrimo, você era meu porto seguro. Mas não posso mais contar com você. Sinto-me terrivelmente sozinha, envelhecida - e pensar que, durante os primeiros anos de casamento me sentia tão cheia de vida e tão jovem - sinto-me sem esperanças. Não tenho mais vontade de ficar aqui, mas não quero ir a parte alguma.
Sinto-me entorpecida, sem chão.
Entrei agora no quarto e vejo a bagunça... pastas com dados de clientes, arremessadas ao chão em mais um ataque de fúria, que dessa vez não fiquei assistindo; roupas amassadas em um canto, e você dormindo, ainda de paletó.
Preferia mil vezes voltar aos nossos primeiros anos de casamento, quando morávamos de aluguel, porém tínhamos esperança no futuro e alegria de viver.

De que adiantou ganhar prestígio social? De que adiantou poder trabalhar em casa? De que adiantou a tv maior, a sala maior, o ar condicionado?
Há tempos não somos felizes. Eu não me sinto feliz.
E mesmo que eu te deixe, não sei se poderei ser feliz de novo.
Marcas psicológicas podem ser mais profundas que marcas físicas.
E eu virei uma frágil caricatura de mim mesma.
Quando você encontrar esta carta, ali do seu lado, não me encontrará mais.
Meu último gesto pode até ser covarde, mas não tenho mais forças. Ainda te amo, se bem que nem sei mais se sou capaz de sentir alguma emoção. Me sinto vivendo dentro de uma mentira.

Quando acordar, espero que encontre a carta. Eu estou desistindo.
Minha saída deste mundo está em minhas mãos, de várias formas e tamanhos coloridos...em poucos minutos eu finalmente conseguirei silêncio.. conseguirei paz.


Música - Quando eu Disser Adeus - LS Jack 
Álbum: V.I.B.E (2001)

(Sim, é uma crônica meio negra.... o mais triste é que existem pessoas que sofrem desse jeito. E muitas vezes , perto da gente.. e não percebemos)


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